sábado, 12 de dezembro de 2009

Da falta de bom senso - Parte III

Aqui estou novamente para criticar a falta de bom senso alheia. Desta vez, meu alvo é essa onda de alguns anos de Vale Tudo, Ultimate Fight, Mixed Martial Arts e afins. Nockei a flecha, retesei o arco, mirei e...

Bem, aproveito a oportunidade para analisar o conceito de Arte Marcial. Marte, no panteão romano, é homólogo a Hares, deus da guerra do panteão grego. Arte marcial, portanto, faz referência à guerras e tudo a elas relacionado. Vale ressaltar que atribuir às técnicas bélicas orientais o termo 'marcial', é, no mínimo, um equívoco cultural, posto que, no caso do Japão, o deus homólogo a Marte é Hachiman no Kami, logo, em vez do termo Arte Marcial, o correto seria chamar as lutas japonesas Artes Hachimanianas (Hachiman no Gi), entretanto, o termo Arte Marcial ficou consagrado pelo uso, não fazendo distinção entre oriente e ocidente.

Quando assim chamamos as lutas que hoje conhecemos, cometemos um equívoco, posto que a forma como são praticadas as lutas hoje, as descaracteriza como artes marciais, uma vez que são praticadas em ambientes fechados, com regras, uniformes e, inclusive, porque não são praticados nas mesmas formas em que eram praticados, posta a evolução decorrente das artes nas quais foram inspiradas. Assim, esclarecido o equívoco, disparo minha flecha.

Muitos praticantes de lutas irracionalmente alegam que a competição de Vale Tudo e congêneres é uma forma de resgate da honra dos samurais, dos guerreiros e bla bla bla... Ok, muito bem, então vamos usar alvos humanos para os tiros com arco, carabina, arremesso de dardos... Francamente, penso que levar uma luta até o knock out usando golpes certeiros e sem controle de impacto é, nada mais, nada menos, de forma nua e crua, um retorno à barbárie! Assim, se é para resgatar os valores antigos a qualquer custo e fazendo disso espetáculo, vamos também resolver as questões legais através de duelos com pistola ou com espadas... É, século XXI e tem gente que não evoluiu com os tempos; para estes, não basta vencer usando a técnica: há que ferir, tirar sangue, quebrar algum(s) osso(s), desarticular algum membro... Vanitas, vanitas et omnia vanitas! Pura vaidade! Eu posso te quebrar! Eu posso te machucar! E vou fazê-lo! É, lamentável, revoltante...

Um tanto menos grave quanto à violência gratuita, é o desconhecimento de professores que 'criam' alunos igualmente ignorantes. Pergunte a um praticante qual a origem do Jiu Jitsu e a maioria esmagadora lhe dirá que a origem está na Índia. As ligações entre o Jiu Jitsu que conhecemos e o Vajramushti indiano é remotíssima! O Jiu Jitsu que conhecemos hoje é produto brasileiro por honra e graça (notaram o cinismo?) de Mitsuyo Maeda, que ensinou as técnicas do Judo aos Gracie, sem poder usar o nome de Judô porque deste havia sido expulso por indisciplina; o Jiu Jitsu é derivado direto, portanto, do Judô, sendo este derivado do Tenshin-Shinyo-Ryu e do Kito-Ryu, dois estilos dentre os tantos conhecidos no Japão Medieval como Jiu Jitsu, sendo estes derivados do Yoshin-Ryu, escola de luta criada por Shirobei Akyama após estudos das lutas chinesas e japonesas. As lutas chinesas, no século VI receberam influência do Vajramushti através de Bodidharma, que, chegando na província de Honan, ensinou as técnicas de sua casta aos monges que deram origem ao Shaolin Ssu Tao Chuan, o tal "Kung Fu de Shaolin".

De forma análoga, há quem coloque o Muay Thai sobre um pedestal, tal como um dos muitos deuses tailandeses, criando (ou reproduzindo) um imaginário de que esta era a arte dos guerreiros Thai. Como um pouco de História não mata ninguém, vamos lembrar que no século XIX a Europa entrou numa onda de neocolonialismo, procurando explorar territórios na Ásia e, assim, os franceses tentaram, mas não conseguiram explorar a Tailândia e, como as culturas circulam a despeito das fronteiras, o Savate, luta francesa, espécie de chute-boxe no qual se usavam sapatos velhos, em francês savate, foi apropriado e somado à antiga forma de lutar, deu origem ao boxe tailandês. Pior que essa ignorância histórica é a ignorância acerca da anatomia humana, quando chamam o Muay Thai de "ciência dos oito membros"; é de conhecimento geral que o corpo humano é composto de um tronco, uma cabeça, dois membros superiores e dois inferiores, daí, quando um praticante deixa subentendido que joelhos e cotovelos também são membros, está passando um atestado de ignorância.

A título de conclusão deste post, afirmo que julgo uma selvageria a prática irracional de certas lutas, bem como a espetacularização da barbárie, enaltecendo, por outro lado, a prática sistemática e refletida das lutas que considerem a evolução da cosnciência paripassu à do corpo e suas habilidades.

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